Já diz o ditado popular, “o que os olhos não veem, o coração não sente”. Porém, uma complicação comum e praticamente invisível nos dentes pode ser sentida pelo coração, trazendo graves consequências ao sistema cardiovascular e até risco de morte. É a endocardite bacteriana, uma infecção que atinge parte da membrana que encobre as válvulas cardíacas, com infecções de origem dentária entre as causas.

“Existem milhões de bactérias na boca e, desde uma simples cárie, a um abscesso periodontal ou gengival, pode ser porta de entrada para outras doenças. Mesmo durante uma cirurgia de extração de dente, por exemplo, pode haver um fator que deixe o estado bucal inadequado”, diz a cirurgiã-dentista Luciana Lucena. “Com essa porta de entrada para as bactérias caírem na corrente sanguínea, elas podem ir parta qualquer lugar do organismo”, completa.

De acordo com ela, além de ir ao dentista regularmente — o recomendado é de seis em seis meses, exceto em casos de intercorrências e imprevistos — e manter a saúde bucal em dia, pessoas que já tenham problemas cardíacos ou propensão devem ter cuidado redobrado. E, mesmo se não houver pré-disposição, o profissional deve avaliar o procedimento a ser realizado para, então, preparar o paciente com antecedência.

“Utilizamos medicamentos antes, deixando o corpo preparado para receber bactérias que possam cair na corrente sanguínea. Sempre se deve fazer a profilaxia antibiótica para evitar que essas bactérias se disseminem na corrente sanguínea. Por exemplo, antes de uma extração dentária, quando vamos fazer uma manipulação mais a fundo dos tecidos, o paciente toma algum tipo de antibiótico, 30 minutos ou até duas horas antes”, explica.

Parceria pela saúde

Apesar de uma das principais causas da endocardite bacteriana surgir comumente na boca, a odontóloga lembra que não faz parte do conhecimento desse profissional tratar ou diagnosticar a endocardite bacteriana diretamente. De acordo com Luciana, há necessidade de um trabalho interdisciplinar (em equipe) dos profissionais que se dedicam a cuidar da saúde do paciente de forma integral.

“Um cirurgião-dentista precisa ser capaz de avaliar e identificar possíveis riscos. Às vezes, o paciente já tem algum problema cardíaco. O profissional deve ter essa informação durante a avaliação para minimizar os riscos. Uma vez identificado que há risco maior de desenvolver a doença, o dentista deve entrar em contato com o cardiologista para ambos analisarem o melhor tratamento”, finaliza.

Endocardite bacteriana é uma inflamação que afeta as válvulas e o tecido que reveste o coração, devido à presença de bactérias que chegam ao órgão por meio da circulação sanguínea. As bactérias da cárie podem ser transportadas pelo sangue até se acumular no coração, onde provocam a inflamação dos tecidos.

Sintomas da endocardite bacteriana

– Aguda: Febre alta; dor no peito; falta de ar; tosse; hemorragia na palma das mãos e nas plantas dos pés.

– Subaguda: febre baixa; calafrios; suor noturno; dor nos músculos e nas articulações; cansaço fácil; dor de cabeça; falta de ar; falta de apetite; emagrecimento; pequenos nódulos doloridos nos dedos das mãos ou dos pés; ruptura de pequenos vasos sanguíneos na parte branca dos olhos, no céu da boca, no interior das bochechas, no peito ou nos dedos das mãos ou dos pés.

Três perguntas

Ter boa saúde bucal pode evitar problemas no coração?

Sim, sobretudo naqueles indivíduos com maior risco de desenvolver endocardite: quem possuiu prótese de valva cardíaca ou aqueles que têm doença valvar reumática. A boca possui uma quantidade enorme de bactérias e, em processos inflamatórios/infecciosos que ocorrem nos casos de má saúde bucal, essas bactérias podem entrar na corrente sanguínea e se instalar nas valvas cardíacas (principalmente em pacientes de alto risco).

Qual é o papel do cardiologista e do dentista no diagnóstico da endocardite bacteriana?

O diagnóstico nem sempre é fácil, muitas vezes um desafio até mesmo para os cardiologistas. Após o diagnóstico, o tratamento constitui em uso de antibióticos por tempo e até mesmo intervenção cirúrgica para reparo da valva acometida, dependendo do caso; além disso, ainda durante a internação hospitalar, é importante avaliação odontológica para que eventuais focos infecciosos na cavidade oral sejam eliminados e, consequentemente, a disseminação da bactéria via corrente sanguínea também seja diminuída.

Quais os riscos?

Se não for reconhecida e tratada a tempo, a endocardite infecciosa costuma destruir a válvula cardíaca acometida, levando o paciente a um quadro de insuficiência cardíaca aguda e grave. Portanto, é de suma importância o bom cuidado da cavidade oral para que este risco seja minimizado.

 

Via A Crítica