Pacientes com necessidades especiais são indivíduos que apresentam uma condição, simples ou complexa, momentânea ou permanente, de etiologia biológica, física, mental, social e/ou comportamental, necessitando de uma abordagem multi-interdisciplinar. A grande maioria desses indivíduos apresentam alterações bucais como doença cárie e periodontal devido, em muitos dos casos, à falta de habilidade e cognição em desempenhar uma satisfatória higienização bucal. Em decorrência disso, é essencial que haja o envolvimento e o comprometimento dos pais/responsáveis no planejamento das atividades, juntamente com a equipe multidisciplinar na tentativa de minimizar a possibilidade de intervenções futuras.

De acordo com o censo demográfico de 2010 (IBGE), 45 milhões de brasileiros, ou seja, 24% da população têm  algum tipo de deficiência. A Internacional Association of Dentistry for Desabilites and Oral Health classifica os  pacientes especiais em dez grupos, segundo os comprometimentos e/ou as áreas afetadas pela patologia que  apresentam, quais sejam: desvios da inteligência, alterações físicas, alterações congênitas, desvios comportamentais, desvios psíquicos, deficiências sensoriais e de audiocomunicação, doenças sistêmicas crônicas, doenças endócrino-metabólicas, desvios sociais e condições fisiológicas especiais.

Assim, o paciente com necessidades especiais é todo indivíduo que possui alteração física, orgânica, intelectual, social ou emocional, alteração essa aguda ou crônica, simples ou complexa. Em Manaus, entre o dia 6 e 9 de  setembro de 2001, a 2.ª Assembleia Nacional de Especialidades Odontológicas (ANEO) aprovou mais uma  especialidade odontológica, a de Pacientes com Necessidades Especiais que normatiza a odontologia para pacientes com necessidades especiais como a especialidade que tem por objetivo o diagnóstico, a prevenção, o tratamento e o controle dos problemas de saúde bucal dos pacientes que apresentam uma complexidade no seu sistema biológico e/ou psicológico e/ou social, bem como percepção e atuação dentro de uma estrutura transdisciplinar com outros  profissionais de saúde e de áreas correlatas com o paciente. A partir de então, o Cirurgião-Dentista especialista  passa a ser também um reabilitador dos pacientes com necessidades especiais e deverá mudar paradigmas para  melhorar a qualidade de vida destes, por meio de tratamentos preconizados pela odontologia convencional e de  estudos multidisciplinares desenvolvidos com outras especialidades.

Normalmente, os pacientes com deficiência possuem alterações no desenvolvimento bucal, devido em muitos casos, por efeitos colaterais das inúmeras medicações que fazem uso, resultando em importantes limitações do sistema estomatognático. Além disso, esses pacientes apresentam maior risco de desenvolver as doenças cárie e periodontal. Isso se explica devido à estreita relação entre o grau de limitação física e/ou mental com a dificuldade da realização da higiene bucal somada à especificidade de sua dieta, que geralmente é rica em carboidratos e alimentos pastosos.

Entre limitações e restrições o grande desafio do tratamento odontológico de pacientes com deficiência envolve a compreensão entre as dificuldades específicas (motoras, comunicação, necessidades odontológicas acumuladas, limitação física, dentre outras) e as inespecíficas (falta de profissionais habilitados, barreiras arquitetônicas e a  superproteção da criança com deficiência).

Além disso, é essencial que haja o envolvimento e o comprometimento dos pais/responsáveis no planejamento das atividades, juntamente com a equipe multidisciplinar na tentativa de minimizar a necessidade de tratamentos odontológicos invasivos.

A primeira consulta odontológica de um paciente com necessidade especial é um momento muito importante pelo fato de recebermos não só um paciente mas sim, uma família especial, cheia de dúvidas, medos e ansiedades quanto ao tratamento.

Deve-se saber abordar e, principalmente, ouvir esta família, pois, neste momento, avalia-se o grau de ansiedade tanto dos cuidadores quanto do paciente e, principalmente, o relacionamento familiar. A anamnese deve ser criteriosa em relação à sua história médica e ao uso de medicações. Aproveitamos a primeira consulta odontológica para observar o comportamento da criança no consultório, sua reação ao ambiente e também em relação ao profissional.

O conhecimento de sua história odontológica pregressa, quando existir, será um importante instrumento para o Cirurgião-Dentista definir o grau de dificuldade que terá à frente, bem como para elaborar um plano de tratamento com condutas que possam facilitar o atendimento odontológico.

Para o estabelecimento da comunicação, controle da ansiedade, medo e dor, as técnicas de abordagem são muito utilizadas com objetivo de facilitar o relacionamento entre o profissional e o paciente e, consequentemente seus familiares. Tais técnicas são classificadas em: educacionais, estabilização protetora e controle farmacológico. Todas possuem indicações precisas, cabendo ao especialista escolher aquela que mais beneficiará seu paciente.

Um programa de saúde bucal bem planejado pode obter alto grau de sucesso na prevenção de doenças bucais e para isso é necessário um esforço integrado entre o paciente, sua família e a equipe multiprofissional. Para real obtenção da saúde bucal, o paciente com necessidades especiais deve ser inserido em um modelo de Promoção de Saúde Bucal, associando métodos educativos, preventivos e reabilitadores. Desta forma, o ideal seria instituir medidas preventivas ainda durante a formação dos dentes decíduos, ou seja, durante a gestação, período no qual as futuras mamães encontram-se motivadas e receptivas a receberem informações e realizar mudanças nos hábitos, visando o bem estar e a saúde de seus bebês.

O protocolo de prevenção para o paciente com necessidades especiais envolve três áreas: a educação do paciente e treinamento dos responsáveis; a integração dos cuidados da saúde bucal nas atividades da vida diária e o cuidado periódico do profissional que, após avaliação criteriosa, determinará o intervalo das consultas de acordo com o risco e/ou atividade da doença cárie e/ou periodontal apresentado pelo paciente na primeira consulta. Desta forma, o retorno das consultas poderá ser mensal, trimestral, semestral ou anual, dependendo do protocolo de prevenção selecionado pelo Cirurgião-Dentista.

Em situações nas quais a colaboração do paciente é limitada podem ser inseridas medidas alternativas que facilitam o atendimento odontológico ambulatorial e até mesmo domiciliar, auxiliando nos procedimentos de higienização e atuação do profissional. Dos métodos adotados merece destaque o uso dos abridores de boca que podem ser confeccionados de diferentes materiais como: de silicone ou de espátulas de madeira e gaze. O uso do abridor de boca tem a finalidade de permitir a visibilidade do campo operatório, evitando acidentes e proporcionando conforto, estabilidade e segurança para o paciente e o profissional durante o atendimento odontológico.

O abridor de boca é uma medida facilitadora utilizada em mais de 90% dos atendimentos odontológicos para pacientes especiais. Este recurso proporciona a estabilização da abertura da boca nos pacientes que apresentam movimentos involuntários comuns naqueles que têm paralisia cerebral, que mesmo tendo o seu perfil cognitivo preservado, apresenta dificuldade para manter a boca aberta. Bem como, nos que manifestam-se com resistência e voluntariamente tentam retirar o abridor da cavidade bucal, dificultando a manutenção da abertura e consequentemente, a intervenção odontológica.

A maioria dos pacientes com necessidades especiais apresentam o perfil não colaborador em decorrência de sua deficiência cognitiva ou mesmo por resistência e medo. E por isso o paciente fará de tudo para dificultar o tratamento odontológico travando fortemente a boca ou realizando movimentos mandibulares bruscos empurrando o abridor para foca da boca. E para minimizar tais movimentos e estabilizar a abertura bucal o abridor de boca deve ser resistente o suficiente para dissipar a força da musculatura sem causar trauma à estrutura dental. Desta forma, o abridor confeccionado em silicone possui uma grande vantagem em relação aos abridores de madeira, pois consegue absorver a energia gerada pelos movimentos involuntário e/ou voluntários sem transferi-la para os dentes, diminuindo consideravelmente a ocorrência de luxação, fratura e/ou avulsão dentária. Além também de poder ser utilizado em pacientes parcial ou totalmente edêntulos sem lesionar a mucosa.

A adaptação do profissional é outra exigência quando se trata de atendimento odontológico aos pacientes especiais, que necessitará ajustar-se às limitações apresentadas por eles como por exemplo, atendê-los em sua própria cadeira de rodas quando cadeirantes. E nestes casos de adaptação é comum o profissional e equipe auxiliar proceder o atendimento odontológico de pé com o objetivo de promover mais conforto e segurança aos pacientes ao mesmo tempo que tenta manter uma certa ergonomia durante o trabalho. Sendo uma população heterogênea, dependente e vulnerável, os pacientes com necessidades especiais, ainda nos dias de hoje encontram muitas barreiras para terem acesso aos serviços de saúde.

Apesar do tratamento odontológico desses pacientes não ser diferente em sua essência mas, exige do Cirurgião-Dentista a adoção de medidas personalizadas de acordo com necessidade específica de cada paciente. Além de tudo isso, o profissional ainda tem uma importante função que é a de orientar e motivar o envolvimento da família, sobre os cuidados que deverão ter com os seus dependentes, despertando sobre o comprometimento diário com a higienização bucal lembrando que todo cuidado gera um vínculo.

Profa Andreia Aquino Marsiglio

Professora da Disciplina de Clínica de Odontologia

para Pacientes Especiais da Universidade

Católica de Brasília (UCB) e criadora do

Abritec PcD. @andreiaaquinomarsiglio

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